O português é importante no Enade ou a falha dele é que ganhou importância?

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Autores: Alexandre Nicolini (Ciência e Ação), Reinaldo Viana (UNIRIO)

No EnadeDrops da semana passada, fechamos um trio de artigos com foco no desempenho dos cursos de Engenharia Civil. Adotamos metodologia que envolveu i) comparar o desempenho do concluinte ao longo de dois ciclos nas provas de Formação Geral (FG) e Formação Específica (FE), ii) usar o índice de dificuldade para chegar a conclusões mais precisas e, iii) buscar um olhar mais apurado com base na situação socioeconômica dos futuros egressos.

Nessa edição do EnadeDrops, nossos esforços estão concentrados em um aspecto relevante, preocupante e alvo de constantes discussões no meio acadêmico: o que podemos dizer sobre o desempenho linguístico dos concluintes? Sim, esse item é avaliado, com base na prova discursiva de FG.

Para melhor compreender como o nosso idioma é avaliado no contexto das questões discursivas de FG, observe a seguir a figura 1:

Figura 1 – Divisão das questões na prova do Enade

A análise da figura 1 permite constatar que:

  • As questões discursivas da prova do Enade representam 25% da Nota Geral. As questões objetivas são 75% da Nota Geral.
  • As questões discursivas são, no total, em número de cinco: duas questões referem-se à FG e três questões são relativas à FE;
  • A nota de cada questão discursiva de FG leva em consideração o peso de 80%referente ao conteúdo que está sendo discutido na questão.
  • Os aspectos de comunicação e expressão na Língua Portuguesa também são considerados e representam 20% da nota;
  • Se considerarmos o peso de todos os componentes (FG e FE) nas provas objetivas e discursivas, verificamos que os aspectos linguísticos têm peso de 2% na Nota Geral.

Para boa parte dos gestores, a representatividade da língua portuguesa pode parecer insignificante, mas lembramos que 2% de ganho representa em média um terço de cada faixa intermediária (2, 3 e 4) no Enade, segundo as análises que conduzimos no semestre passado. Isso pode ser decisivo para um melhor resultado e arriscamos dizer que, ao impactar na compreensão do texto por parte de quem corrige a prova do Enade, pode se ampliar significativamente nas questões de FE.

E como é conduzida a avaliação de desempenho dos estudantes na Língua Portuguesa? Segundo o INEP, estes 20% em cada questão discursiva de FG são calculados de acordo com o barema abaixo:

  • Aspectos Ortográficos: 30%
  • Aspectos Textuais: 20%
  • Aspectos morfossintáticos e vocabulares: 50%

Ressaltamos que uma rica fonte de informação a respeito desse tema está presente no Relatório de Síntese Área 2017 – Língua Portuguesa, disponível no sítio do Inep. Com base nesse documento, optamos por listar a seguir algumas conclusões (preocupantes) presentes no documento nos três aspectos já citados:

  • Aspectos Ortográficos: “Os resultados revelam que a tendência dominante entre os universitários brasileiros é a eliminação da acentuação gráfica, talvez motivada pelos hábitos relacionados às redes sociais e pela ausência de esclarecimento dos meios de comunicação, das autoridades e das escolas sobre as decisões do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990.”
  • Aspectos Textuais: “Esta competência é a que se revela como a mais problemática entre os participantes, porque são muitos os problemas observados, desvios acumulados durante toda a formação do estudante e que não se resolvem com um estudo autodidata, como acontece com regras ortográficas ou morfossintáticas.”
  • Aspectos morfossintáticos e vocabulares: “Quanto aos aspectos vocabulares, alguns tipos de inadequação foram observados: expressões da oralidade; seleção vocabular incompatível com o contexto, gerando falta de inteligibilidade; falta de domínio de vocabulário mais abstrato e de maior complexidade, essencial ao desenvolvimento do texto de base dissertativa.”

Está certo que recebemos estudantes que trazem problemas desde muito cedo na sua vida escolar, mas o fato é que poucas IES estão verdadeiramente preocupadas em fazer com que o estudante leia mais, interprete criticamente e escreva melhor. Os problemas dos estudantes nós conhecemos, mas estamos muitas vezes acomodados nas reclamações para perceber que existem soluções simples e de grande impacto no desempenho deles.

Deixamos como exercício para o leitor a atividade de baixar o relatório e ler os principais exemplos de erros encontrados em cada categoria avaliada. Mas gostaríamos antes de citar outra conclusão do relatório, essa mais abrangente: “A correção revelou desempenhos distintos dos participantes, marcados pela falta de repertório cultural da maioria dos participantes

Em outras edições do EnadeDrops trouxemos reflexões envolvendo aspectos socioeconômicos dos concluintes. Não faremos diferente aqui: a partir da semana que vem, vamos relacionar Desempenho dos cursos na Língua Portuguesa x  Renda Familiar, com base na edição de 2017.

Até a próxima quarta!

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