O bom desempenho em Português auxilia apenas as questões discursivas de formação geral ou tem impactos nas outras partes do Enade?
Autores: Alexandre Nicolini (Ciência e Ação), Reinaldo Viana (UNIRIO)
No EnadeDrops anterior, analisamos a edição 2017 do Enade sob a ótica do desempenho dos concluintes na Língua Portuguesa versus Renda Familiar. Para isso, mapeamos as graduações por categoria – tecnólogos, bacharelados e licenciaturas. Em seguida, avaliamos desempenho versus situação econômica do concluinte. Percebemos que, de forma geral, apesar da esperada melhora das notas junto ao aumento da renda, esse comportamento não ocorreu em todas as categorias analisadas.
Nessa edição, queremos saber o seguinte: o concluinte que foi bem em Língua Portuguesa foi melhor na Formação Geral (FG) e na Formação Específica(FE)? Em outras palavras: será que quem compreende e se expressa melhor na nossa língua leva vantagem na prova do Enade de forma mais ampla?
Lembramos ao leitor que a Língua Portuguesa é cobrada nas duas questões discursivas de FG. Dessa forma, é praticamente obrigatório investigarmos como foi o afinco do concluinte em relação ao desenvolvimento dessas questões. Para isso, buscamos nos microdados informações sobre os tipos de situação de cada questão discursiva da prova de FG. Na edição de 2017, foi usada a codificação a seguir:
Grupo I – Resultados considerados para o cálculo da nota do concluinte:
- 333 = Questão em branco (estudante presente).
- 335 = Questão zerada por motivo de resposta nula.
- 336 = Questão zerada por motivo de resposta divergente com a temática.
- 555 = Questão com resultado válido.
Grupo II – Resultados desconsiderados para o cálculo da nota do concluinte:
- 222 = Não se aplica (estudante ausente).
- 556 = Questão com resultado desconsiderado devido a problemas administrativos.
- 888 = Questão não respondida por problemas administrativos.
- (Vazio) = Não se aplica (sem ensalamento).
Estamos obviamente interessados no desempenho dos concluintes do Grupo I, pois, segundo o Inep, tais estudantes estão enquadrados em situações válidas no cálculo da nota discursiva de FG.
Nessa edição do EnadeDrops analisamos os cursos tecnólogos. Assim, o leitor encontra na Figura 1 seguir a distribuição concluintes do Grupo I sob o contexto das questões discursivas 1 e 2 de FG, respectivamente:
Uma breve análise da figura 1 (Questão 1 Discursiva FG) nos permite afirmar que o curso de Gestão da Produção Industrial teve o maior percentual de concluintes (90%) com resultado válido na questão. No outro extremo, o curso de Redes de Computadores (81%), que também teve o maior percentual de alunos com essa questão em branco (17,5%). Tais alunos tiraram zero na questão.
Já a análise da Questão 2 Discursiva FG na mesma figura nos permite verificar que os cursos de Gestão da Produção Industrial e Gestão da Tecnologia da Informação tiveram o maior percentual de concluintes (85%) com resultado válido na questão. Já o curso de Redes de Computadores teve menos aproveitamento (74%), inclusive com o maior percentual de alunos com essa questão em branco (24%). Tais alunos tiraram zero na questão.
Escolhemos justamente o curso de Redes de Computadores para dar aprofundar nossas análises. Desenvolvemos o seguinte roteiro em três etapas:
- Calcular o Desempenho dos concluintes na Língua Portuguesa (média aritmética das notas de Português obtidas das questões 1 e 2 de FG).
- Dividir os concluintes em dois conjuntos, de acordo com o Desempenho na Língua Portuguesa: conjunto 1 (Desempenho entre de 0 e 50), e; conjunto 2 (Desempenho entre 50 e 100)
- Para cada conjunto, analisar as seguintes notas:
- Objetivas FG: desempenho nas questões objetivas de Formação Geral.
- Objetivas FE: desempenho nas questões objetivas de Formação Específica.
- Nota FG: desempenho na prova de Formação Geral.
- Nota FE: desempenho na prova de Formação Específica.
As figuras 2 e 3 a seguir apresentam os resultados dos concluintes do curso de Redes de computadores, com base na metodologia apresentada acima.
Vamos comparar o desempenho do grupo de concluintes da figura 2 com os da figura 3 a seguir.
Podemos notar então que:
- Nas questões objetivas de FG o desempenho do segundo grupo foi maior que o do primeiro em cerca de 5 pontos, demonstrando que a melhor formação em língua portuguesa realmente tem um impacto positivo nesta parte da prova.
- Na prova de FG o impacto foi muito maior, cerca de 19 pontos a favor do segundo grupo.
- Nas questões objetivas de FE o desempenho do segundo grupo foi quase similar, embora maior que o do primeiro em cerca de 1,5 ponto. Vamos considerar que nesta parte da prova o impacto do bom português deve ser menor porque a linguagem da prova é decididamente mais técnica, formada pelas terminologias que foram estudadas ao longo do curso.
- Na prova de FE o desempenho do segundo grupo foi ligeiramente maior que o do primeiro, com diferença de quase dois pontos. Entendemos que no curso de Redes de Computadores o desempenho em FE não mais afetado pelo desempenho na Língua Portuguesa pelo caráter das questões discursivas apresentadas nessa edição: esquemático, conceitual e pouco analítico.
Além das conclusões acima, convém ressaltar que o desempenho médio na Língua Portuguesa dos concluintes reportados na figura 1 foi em torno de 20. Na figura 2, em torno de 60.
Estamos indo para o final do nosso artigo. Não temos pretensão de esgotar essa temática, mas a cada edição vamos tendo mais curiosidade sobre os aspectos relacionados à motivação do aluno ao resolver a prova. Por que 24% dos concluintes de redes – simplesmente – deixaram a questão 2 de FG em branco? Falta de conhecimento? Falta de motivação? Deixem seus comentários!
Até a próxima!